Jacques Villeglé e o retrato da efervescência urbana

No artigo Intervenção autoral: A arte de Jacques Villeglé, postado no site da Revista ARTFORUM, o critico Tom McDonough discorre sobre o estilo, a trajetória e as ressonâncias do artista francês que fez de cartazes rasgados, roubados das ruas de Paris, a matéria prima de uma arte que traduziu a efervescência urbana das metrópoles do mundo.

O artista flâneur - caminhante, observador e intelectual, vagou por uma Paris marcada pela guerra: "Enquanto caminhava pelas ruas, fiquei impressionado com a cor e a tipografia dos cartazes”. A admiração o levou a roubar anúncios de outdoors, cartazes políticos e panfletos de concertos de jazz e exposições de arte, transformando os fragmentos rasgados em colagens que expressavam o clima socio-político-econômico-cultural de uma sociedade e já apontava conceitos como o do "artista DJ" e da “morte do autor”.

Os pôsteres coletados manifestavam os anseios políticos, a poesia e a publicidade de uma época, além de ilustrarem o estilo de designers, tipógrafos, artistas e cidadãos comuns, que deixavam suas marcas na construção coletiva.

Na visão de McDonough, a arte de Villeglé era um retrato do espírito do tempo, uma coleção de vestígios da vida urbana. Suas colagens soavam como música; imprimiam ritmo, textura, dinâmica e a velocidade da cidade e da cultura sob a regência do capitalismo. Villeglé registrava o tempo, o espaço e os afetos que se agitavam na esfera pública, como a raiva e a rebeldia que moviam os transeuntes anônimos a rasgarem os cartazes em "gestos espontâneos e iconoclastas”. Suas colagens eram exemplos de composição, e estudo da forma, nunca caindo no caos visual em que tropeçam alguns artistas contemporâneos. Villeglé mantinha visualmente a elegância da composição e um certo polimento modernista francês no comportamento das cores.

McDonough aponta que Villeglé acompanhou as transformações sociais, urbanas e paisagísticas ao longo das décadas, retratando o florescimento, e a efervescência de cenas como maio de 68, onde os cartazes se multiplicavam nas ruas de Paris, o surgimento do punk nos anos 70, até os anos 2000, quando houve uma decadência da expressão social. O crítico também destaca as diferentes fases de Villeglé e suas possíveis influências, como a colagem cubista e o jogo de criatividade coletiva criado pelos surrealistas. McDonough considera a estética dos cartazes rasgados como uma proto-pop art, na qual o artista antecede Andy Warhol no desafio de compilar a iconografia de seu tempo.

Linda Ferreira




Jacques Villeglé, Jazzman, 1961

Jacques Villeglé, Rue Lefranc. 

Fonte: https://www.artforum.com/features/authorial-intervention-the-art-of-jacques-villegle-190360/



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