A
escultura Moema foi feita em gesso por Rodolpho Bernardelli para a
exposição anual de 1895 e, posteriormente, foi fundida em bronze. Inspirada na
personagem inscrita no poema histórico Caramuru, de Santa Rita Durão, a
escultura em tamanho natural, traz a personagem de Moema como uma mulher
jovem, com feições delicadas, corpo torneado e uma postura elegante. O estilo
neoclássico, que dominava a arte acadêmica da época, está presente na suavidade
das formas e no tratamento cuidadoso dos detalhes, como o cabelo e a musculatura
da figura, evidenciando a grande técnica do escultor. A obra se encontra no
Museu Nacional de Belas Artes. Conforme documentação pertencente ao seu Arquivo
Histórico, este museu recebeu parte do acervo de Rodolpho Bernardelli depois de
sua morte, por meio de doação feita por seu irmão, Henrique Bernardelli.
É
importante salientar que a Moema de Bernardelli deriva de gesso
esculpido pelo artista e que passou para o bronze, a partir de 1939, apenas
depois de sua morte. Seria um esboço para uma posterior execução em mármore,
como também seriam as estátuas da Faceira e Santo Estevão, conforme apontam as
críticas da época. Todavia, o destino em comum das três não foi o mármore e,
sim, o bronze. Outro aspecto importante é que Bernardelli participava
ativamente na criação de suas obras, retocando o gesso com habilidade, e quando
o “trabalho era passado ao bronze, constantemente ia [...] à fundição, retocar
a cera com maior atenção, bem como algum detalhe do metal que o exigisse”
(ANPAP, 2019, pag.596 apud Vaccani, 1949). Assim, tendo ocorrido a fundição de Moema
apenas depois de sua morte, a obra não sofreu o retoque que era costumeiro do
escultor no momento de sua finalização. A transição do gesso para o bronze em Moema
se revelou-se um processo intrincado que abre questões sobre as especificidades
da obra e seu questionamento enquanto objeto de arte. Esta obra de Bernardelli
é um caso simbólico, o que nos leva a refletir criticamente sobre os processos
de transição de obras, de qualquer natureza, em qualquer tempo, lugar e de
qualquer autor.
A
escultura de Moema apresenta uma forma elegante e harmoniosa, inspirada
na estética clássica grega. Suas linhas sinuosas e curvas suaves criam um
efeito de fluidez. Os detalhes, como os cabelos, vestimenta e sua imersão na
água, demonstram habilidade técnica do autor. A sua forma visual apresenta
vestígio da temática do indianismo, bem como da morte na água, da morte
romântica e do nu feminino. A principal característica de Moema é a
representação da mulher indígena idealizada, um dos estereótipos da figura
feminina no Brasil durante o período romântico. O caráter idealizado de Moema,
uma mulher pura, bela e doce, reflete as noções de feminilidade e de natureza
que os artistas românticos associavam à cultura indígena.
Moema
é uma obra que demonstra o domínio técnico e a visão romântica de Rodolfo
Bernardelli, mas também reflete as limitações do seu tempo no que diz respeito
ao entendimento das culturas indígenas. Bernardelli se afasta da representação
realista de um ser humano, ao adotar uma linguagem que visa exaltar mais o
ideal de beleza do que a própria realidade das populações indígenas. Isso é
especialmente notável na forma com que ele esculpe o corpo da personagem, que,
embora claramente inspirado nos modelos clássicos, sugere uma suavidade e
harmonia que são um reflexo das convenções estéticas do período. A escultura é,
ao mesmo tempo, um exemplo da busca pela identidade nacional brasileira e uma
obra que idealiza a figura indígena, ao perpetuar visões que não fazem justiça
à complexidade da história e das culturas nativas do Brasil.
Manoel
Ricardo Caires Fernandes
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